Jesus o Bom Pastor

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03 setembro 2010

Os 2 lados das Cruzadas






Os 2 lados das Cruzadas
Há quase mil anos, o Ocidente trombou com o Oriente. O mundo cristão invadiu o mundo muçulmano e deu origem a 200 anos de guerra. Só dá para entender essa história se conhecermos os dois lados dela
por Rodrigo Cavalcante
Cruzada. No mundo pós-11 de setembro, a simples menção dessa palavra causa polêmica. Após o ataque às torres gêmeas, o presidente George W. Bush teve de pedir desculpas por usar o termo “cruzada” para nomear sua guerra contra o terrorismo. Osama bin Laden aproveitou a gafe. Em seu pronunciamento, o terrorista classificou a guerra no Afeganistão de “cruzada religiosa contra os muçulmanos”. A palavra ressuscitava dos livros de história. Só faltava Hollywood se interessar pelo assunto. Não deu outra.

O enredo do filme Cruzadas, de Ridley Scott, que está chegando aos cinemas, gira em torno de um ferreiro que se torna cruzado. Em tempos de Guerra no Iraque, nada mais natural que um filme com tema tão espinhoso despertasse protestos antes mesmo do lançamento. Em agosto de 2004, o jornal The New York Times entregou o roteiro de Cruzadas para teólogos cristãos e islâmicos. Os cristãos não viram problema, mas os muçulmanos acusaram o filme de estar cheio de erros.

Afinal, o que foram as cruzadas? Um ato de fé e heroísmo? Um massacre covarde? “Não faz sentido buscar hoje bandidos e mocinhos”, diz o holandês Peter Demant, historiador da USP. “As batalhas tiveram significados diferentes para o Ocidente e o Oriente”. Existem, portanto, duas histórias das Cruzadas. Nada melhor do que narrar essa história dos dois pontos de vista. Como você poderá constatar nos dois textos que correm nas páginas seguintes, as versões não se contradizem. São olhares diferentes que ajudam a entender por que, nove séculos depois, o assunto continua fascinando – e causando polêmica – nos dois lados do mundo.



O exército de Cristo
No dia 27 de novembro de 1095, o papa Urbano II fez um comício ao ar livre nas cercanias da cidade de Clermont, na França. Na audiência, além de muitos bispos, havia nobres e cavaleiros. Depois desse sermão, o mundo nunca mais seria o mesmo.

No discurso, o papa tentou convencer os espectadores a embarcar numa missão que parecia impossível: cruzar 3 mil quilômetros até a cidade santa de Jerusalém e expulsar os muçulmanos, que dominavam o lugar desde 638. Segundo os historiadores, Urbano II deve ter usado uma linguagem vibrante e provavelmente falou dos horrores que os peregrinos cristãos à Terra Santa estavam vivendo. Do alto de sua autoridade divina de substituto de São Pedro na Igreja, o papa prometeu: quem lutasse contra os infiéis ganharia perdão de todos os pecados e lugar garantido no paraíso. Um prêmio tentador no imaginário do homem cristão medieval, sempre atormentado pela ameaça de queimar no inferno.

A reação da multidão foi imediata. Gritos de “Essa é a vontade de Deus” começaram a ecoar. A pregação mal havia terminado e o bispo Ademar de Monteil, num gesto provavelmente ensaiado, ajoelhou-se diante do papa e “tomou a cruz”, ritual de alistamento em que o voluntário recebia uma cruz de pano que deveria ser costurada na altura do ombro do uniforme de batalha. Ademar embarcaria na primeira cruzada. Dali em diante, aquela cruz passaria a identificar os “soldados de Cristo”, ou, simplesmente, “cruzados”.

Segundo os historiadores, a intenção do papa era convocar apenas cavaleiros bem preparados. Mas seu discurso empolgou especialmente os camponeses pobres que tinham pouco a perder. As cruzadas terminariam entrando para a história como o maior movimento populacional da Idade Média, redefinindo para sempre o mapa do mundo.

A ameaça do Islã

No século 11, não havia dúvidas: o Islã era a religião mais forte do planeta. Em menos de cinco séculos, desde a morte de Maomé, em 632, a palavra de Alá tinha conquistado a Península Arábica, o norte da África, a Ásia Central, Espanha, Portugal, grande parte da Índia e até um pedacinho da China.

Não era uma hegemonia apenas religiosa. Os muçulmanos superavam os cristãos em ramos como a matemática, a astronomia, a medicina e a química. Não havia cidade européia que se comparasse aos centros islâmicos. O Cairo sozinho abrigava tanta gente quanto Paris, Veneza e Florença juntas, as três maiores cidades cristãs da época.

Foi quando chegou ao papa um pedido de ajuda do Império Cristão Bizantino. A sede do império, Constantinopla (atual Istambul, capital da Turquia), era o maior centro do cristianismo naquela parte do mundo. Os bizantinos estavam preocupados com a presença nas suas fronteiras dos muçulmanos, naquela época governados por uma agressiva monarquia de etnia turca, os seljúcidas. Originados de uma tribo de saqueadores nômades das estepes da Ásia Central, os seljúcidas haviam conquistado os territórios do califado de Bagdá no século 10 e, após se converterem ao islamismo, tornaram-se a maior força muçulmana. E eles queriam mais. Já tinham tomado a cidade bizantina de Nicéia e estavam a menos de 160 quilômetros de Constantinopla, o equivalente a três dias a cavalo.

Naquele momento, não restava alternativa ao imperador bizantino Aleixo Comenos a não ser apelar para seus confrades europeus. Só que, quando o imperador avistou a primeira leva de combatentes cristãos, teve motivos de sobra para se preocupar.

Cruzada Popular

Se é verdade que a intenção do papa era enviar um exército forte e organizado, formado pela elite dos cavaleiros, ele se frustrou um pouquinho. Uma série de pregadores populares começaram a incitar o povão a atacar os “infiéis”. A promessa de remissão dos pecados, aliada à chance de pilhar tesouros lendários, era bem atraente. Velhos, mulheres e crianças resolveram se lançar na aventura.

O primeiro desses exércitos foi liderado por um pregador conhecido como Pedro, o Eremita. Já no caminho, seus seguidores criaram tumultos, massacrando comunidades judaicas em cidades como Trier e Colônia, na atual Alemanha. “As cruzadas fugiram do controle”, diz a professora Leila Rodrigues da Silva, professora de História Medieval da UFRJ. “É provável que muitas dessas pessoas nem soubessem diferenciar um judeu de um muçulmano.”

Ainda assim, o imperador bizantino recebeu os seguidores do Eremita em Constantinopla. Prudentemente, Aleixo aconselhou o grupo a aguardar a chegada de tropas mais bem equipadas. Mas a turba começou a saquear a cidade e foi obrigada a se alojar fora de Constantinopla, perto da fronteira muçulmana. Até que, em agosto de 1096, o bando inquieto cansou-se de esperar e partiu para a ofensiva. Foi massacrado.

Somente dois meses após essa “cruzada popular” começaram a chegar a Constantinopla os primeiros exércitos liderados por nobres. Esses homens estavam interessados em mais do que um lugarzinho no céu. “Nessa época, a Europa vivia um boom populacional e a pressão pela posse de terras era muito grande”, diz a historiadora da Idade Média Fátima Fernandes, da UFPR. “Os filhos de nobres que não eram primogênitos só podiam enriquecer por meio de um bom casamento, algo cada vez mais difícil. As cruzadas abriram uma esperança para eles”, diz ela.

Até que foi fácil
O primeiro líder nobre a chegar a Constantinopla, em dezembro de 1096, foi o conde Hugo de Vermandois, primo do rei da França, que veio pelo mar com seus cavaleiros e soldados. Logo depois, vindo pela mesma rota, aportou o duque da Baixa-Lorena, Godofredo de Bouillon, acompanhado de irmãos e primos. Para financiar sua participação na cruzada, Godofredo vendera seu castelo – o que prova que não pretendia voltar para casa.

Em abril de 1097, cerca de 40 mil homens atravessaram o estreito de Bósforo (que separa a Europa da Ásia) sem encontrar resistência. O governante muçulmano, o sultão turco Kilij Arslan, iludido pela facilidade com que havia derrotado os pobres cruzados do Eremita, estava mais preocupado com disputas internas com vizinhos muçulmanos do que com a chegada de um novo contingente de cristãos. Como o sultão iria perceber apenas tarde demais, esse seria o maior erro de sua vida.

Dessa vez, bem equipados com escudos, armaduras e cavalaria, os cruzados cercaram e tomaram Nicéia, devolvendo-a aos bizantinos. Em outubro de 1097, eles chegaram a Antióquia, conquistando aquela que havia sido uma das principais cidades do Império Romano. Seis meses depois, os cristãos partiram em direção a Jerusalém. A essa altura, restavam 13 mil homens, um terço do contingente inicial. Após um mês de cerco, em 13 de julho de 1099, os cruzados conseguiram finalmente entrar na cidade santa. No dia 15 venceram as últimas resistências.

Para a maioria deles, a conquista fora um milagre. Menos de quatro anos após a pregação em Clermont, os cristãos vitoriosos saíam em procissão para o Santuário do Santo Sepulcro, onde Cristo teria ressuscitado. O papa Urbano II morreu duas semanas depois, sem ter recebido a boa notícia da vitória. Mas ele também foi poupado das más notícias que chegariam depois.

Derrota após derrota

Foram criados quatro Estados cristãos nos territórios conquistados. Ao sul, o mais importante, o Reino de Jerusalém, governado por Godofredo de Bouillon. Um pouco acima estavam o Estado de Trípoli, o Principado de Antióquia e o Condado de Edessa. Os chefes desses Estados logo perceberam que a permanência lá não seria fácil.

Os governantes cristãos logo perderam o apoio dos bizantinos, porque se recusavam a reconhecer a soberania do Império na região e não haviam demonstrado nenhum escrúpulo em substituir os patriarcas da Igreja Ortodoxa Bizantina por bispos oriundos da Igreja Católica Romana. Para piorar, não havia soldados suficientes para a formação de grandes exércitos. Logo após a conquista de Jerusalém, milhares de cavaleiros regressaram à Europa.

Em 1144, a perda de Edessa para os muçulmanos foi a primeira prova da vulnerabilidade cristã. Com o objetivo de recuperar o território perdido, o papa Eugênio III lançou uma segunda cruzada em 1145, liderada por Luís VII, rei da França. Foi um fracasso. O filme que está chegando aos cinemas retrata as cruzadas a partir desse período.

Mas o pior estava por vir. Em 1187, sob a liderança de Saladino – o sultão que unificou os muçulmanos e até hoje é venerado por seguidores do Islã no mundo inteiro –, os muçulmanos reconquistaram o Reino de Jerusalém. Era o começo do fim.

A perda de Jerusalém foi um choque para a Europa cristã, apesar de Saladino ter permitido peregrinações ao Santo Sepulcro. Dali em diante, houve pelo menos mais quatro grandes cruzadas em direção à Terra Santa e os cristãos colecionaram derrotas e vexames. Um dos piores foi o de 1204, quando uma cruzada acabou atacando e saqueando a cidade cristã de Constantinopla, deixando cicatrizes profundas na relação entre os cristãos do Oriente e do Ocidente. Em 1212, organizou-se uma cruzada formada por adolescentes, a “Cruzada das Crianças”. Seus participantes, na maioria, terminaram mortos ou vendidos como escravos.

A herança cruzada

Mas, afinal, qual foi a herança das cruzadas para o Ocidente?

Segundo os historiadores, elas deixaram diversas marcas negativas, como a separação da Igreja do Ocidente e do Oriente e um rastro de violência que fez aumentar a desconfiança entre cristãos e muçulmanos nos anos seguintes.

Em compensação, é inegável que a Europa, apesar de não ter conquistado seus objetivos, saiu fortalecida. As cruzadas reforçaram a autoridade dos reis, abrindo caminho para a criação dos Estados Nacionais. Elas também impulsionaram o comércio com o Oriente, enriquecendo as cidades italianas que iriam ter papel fundamental na sofisticação das transações financeiras até resultar na criação do sistema bancário. Além disso, reforçaram a identidade cristã no Ocidente. E paradoxalmente, apresentaram os costumes orientais aos ocidentais, dos tapetes às especiarias. Essas novidades gerariam curiosidade na Europa, o que impulsionaria a busca por outras terras. Como o Brasil.

Mas isso tudo é só metade da história. Volte à página 54 para conhecer o lado menos conhecido das cruzadas.

Para saber mais

Na livraria:

The Oxford Ilustrated History of The Crusades - Jonathan Riley-Smith (org.), Oxford University Press, Reino Unido, 2001

Dicionário Temático do Ocidente Medieval - Jacques Le Goff e Jean-Claude Schmitt (orgs), Universidade do Sagrado Coração, 2002

Os Templários - Piers Paul Read, Imago, 2000

O Livro de Ouro dos Papas - Paul Johnson, Ediouro, 1998


A invasão bárbara
Foi um dia de terror. Em 15 de julho de 1099, milhares de guerreiros loiros entraram em Jerusalém matando adultos, velhos e crianças, estuprando as mulheres e saqueando mesquitas e casas. As ruas se transformaram numa imensa poça de sangue. Os poucos sobreviventes tiveram de enterrar os parentes rapidamente antes que eles próprios fossem presos e vendidos como escravos. Dois dias depois, não havia sequer um muçulmano em Jerusalém. Tampouco havia judeus. Nas primeiras horas da batalha, muitos deles participaram da defesa do seu bairro, a Juderia. Mas, quando os cavaleiros invadiram as ruas, os judeus entraram em pânico. A comunidade inteira, repetindo um gesto ancestral, reuniu-se na sinagoga para orar. Os invasores bloquearam as saídas, jogaram lenha e atearam fogo à sinagoga. Os judeus que não morreram queimados foram assassinados na rua.

A cena é narrada em As Cruzadas Vistas pelos Árabes, do libanês radicado na França Amin Maalouf. Seu livro é uma tentativa de contar as cruzadas do ponto de vista de quem estava do lado de lá. Para os cronistas muçulmanos, na verdade, não existiram cruzadas. As investidas cristãs em seus territórios ficariam conhecidas como as invasões dos francos (porque a maioria dos cruzados falava o francês), um período de terror e brutalidade na história do Islã.

Lá vêm eles
A primeira investida dos francos, ocorrida em 1096, três anos antes do terrível ataque a Jerusalém, não chegou a assustar o sultão turco Kilij Arslan, que comandava os territórios do atual Afeganistão até o que viria a se chamar, séculos depois, de Turquia. Liderado por um tal de Pedro, o Eremita, o grupo que se aproximava de Constantinopla com a ameaça de exterminar todos os muçulmanos da região mais parecia um bando de mendigos maltrapilhos. Entre os guerreiros, havia uma multidão de mulheres, velhos e crianças – um inimigo muito menos ameaçador do que os cavaleiros mercenários que o sultão estava acostumado a enfrentar.

Durante um mês, mais ou menos, tudo o que os cavaleiros turcos fizeram foi observar a movimentação dos invasores, que se ocupavam apenas de saquear as regiões próximas do acampamento onde foram alojados. Quando parte dos europeus resolveu partir em direção às muralhas de Nicéia, cidade dominada pelos muçulmanos, uma primeira patrulha de soldados do sultão foi enviada, sem sucesso, para barrá-los. Animado pela primeira vitória, o exército do Eremita continuou o ataque a Nicéia, tomou uma fortaleza da região e comemorou se embriagando, sem saber que estava caindo numa emboscada. O sultão mandou seus cavaleiros cercarem a fortaleza e cortarem os canais que levavam àgua aos invasores. Foi só esperar que a sede se encarregasse de aniquilá-los e derrotá-los, o que levou cerca de uma semana.

Quanto ao restante dos cruzados maltrapilhos, foi ainda mais fácil exterminá-los. Tão logo os francos tentaram uma ofensiva, marchando lentamente e levantando uma nuvem de poeira, foram recebidos por um ataque de flechas. A maioria morreu ali mesmo, já que não dispunha de nenhuma proteção. Os que sobreviveram fugiram em pânico. O sultão, que havia ouvido histórias temíveis sobre os francos, respirou aliviado. Mal imaginava ele que aquela era apenas a primeira invasão e que cavaleiros bem mais preparados ainda estavam por vir.

Ataque surpresa

Em meados de 1097, um ano depois da vitória sobre os homens do Eremita, os muçulmanos não estavam lá muito preocupados com a notícia da chegada de novos invasores. Mas a segunda leva de cavaleiros francos que marchava em direção aos seus territórios em nada se parecia com aqueles maltrapilhos ingênuos e despreparados. Bem protegidos com armaduras e escudos, os cavaleiros que agora chegavam não seriam presa fácil para as flechas lançadas pelos arqueiros turcos. Quando os muçulmanos se deram conta dessa diferença, já era tarde demais.

Em poucos dias, os cruzados invadiram a cidade de Nicéia e continuaram marchando como um verdadeiro furacão. Os exércitos turcos mal acabavam de lutar contra uma leva de invasores e, pronto, chegava um novo contingente ainda mais numeroso. Em pânico, a população de cidades como Antióquia avistava desesperada a chegada daqueles cavaleiros. Não havia nada a fazer. Alguns muçulmanos acreditavam até que se tratava do fim do mundo. Relatos do período diziam que o final dos tempos seria precedido pelo nascer de um gigantesco sol negro, vindo do Oeste, acompanhado de hordas de bárbaros. Se o sol negro ainda não havia aparecido, os bárbaros, ao menos, já davam as caras.

A nova ofensiva, que culminou com a brutal invasão de Jerusalém, em julho de 1099, alteraria para sempre a visão que o Oriente tinha do Ocidente. Os saques, estupros e assassinatos de crianças não eram nada condizentes com o tratamento que os próprios mulçumanos sempre deram aos cristãos e judeus que viviam em seus territórios. Quando eles chegaram a Jerusalém, no século 7, fizeram questão de preservar as igrejas cristãs e sinagogas judaicas. O acordo era claro: desde que esses povos não insultassem o profeta e não deixassem de pagar seus impostos, eles sempre teriam a liberdade para viver de acordo com suas crenças e suas próprias leis. Os poucos casos de governos hostis aos judeus e cristãos não passavam de exceções em longos períodos de convivência pacífica.

Com a queda de Jerusalém e a derrota para os francos, os mulçumanos aprenderam uma difícil lição: enquanto estivessem desunidos, o futuro do Islã estaria comprometido. Para que essa união fosse possível, contudo, seria necessário o surgimento de um líder respeitado pela maioria dos muçulmanos. Ele apareceu quase um século depois.

A reação islâmica
O homem que se transformaria no herói da reação muçulmana era um soldado curdo chamado Salah al-Din, conhecido no Ocidente como Saladino. Até hoje seu nome é venerado como símbolo da resistência contra o Ocidente – o próprio Saddam Hussein, conhecido pelas atrocidades cometidas contra os curdos de seu país, citou várias vezes o nome de Saladino aos iraquianos nos dias que antecederam a invasão americana.

Décadas após a fundação dos reinos cristãos no Oriente, os muçulmanos ainda não haviam conseguido retomar a maioria dos territórios perdidos. As disputas entre os diversos califas e sultões tampouco ajudavam na reconquista. Em 1174, ao tornar-se o soberano mais importante do mundo muçulmano, Saladino já pensava em como unir os estados islâmicos para uma contra-ofensiva.

A chave do sucesso de Saladino era um misto de profunda convicção religiosa e pragmatismo militar. Para derrotar os cruzados, ele pregava a união de todos os muçulmanos em torno da jihad, a guerra santa do Islã. Relatos contam que ele costumava reclamar que os muçulmanos não lutavam com o mesmo fervor dos cristãos. Após organizar os exércitos e treinar novas técnicas de combate, ele conseguiria o que muitos consideravam impossível: em 1187, reconquistou a cidade sagrada de Jerusalém, que havia 88 anos estava nas mãos dos cristãos. Após entrarem na cidade, muitos muçulmanos quiseram destruir a Igreja do Santo Sepulcro e matar todos os cristãos por vingança pelas atrocidades cometidas na invasão dos cruzados. Saladino, porém, fez questão de conter os ânimos dos seus soldados, preservando tanto a igreja quanto a vida dos cristãos.

Como já era esperado, a queda de Jerusalém foi um choque para o Ocidente. A cada derrota no front cristão, novas cruzadas eram enviadas ao Oriente, arrastando a batalha por décadas. O último bastião cristão na região só seria derrubado mais de um século após a tomada de Jerusalém por Saladino. O capítulo das cruzadas medievais terminaria apenas em 1291, quando os muçulmanos expulsaram os cristãos do Reino do Acre, ao norte de Jerusalém.

O legado da briga
Durante muito tempo, uma pergunta intrigou historiadores tanto do Ocidente quanto do Oriente: se os muçulmanos saíram vitoriosos das cruzadas, por que os estados islâmicos terminaram sendo ofuscados, no séculos seguintes, pela ascensão de potências européias?

Segundo a maioria dos pesquisadores, a ascensão européia tem menos ligação com as cruzadas e mais a ver com a debilidade dos governos muçulmanos da época. Essa fraqueza estava ligada a vários fatores, entre eles a falta de identidade árabe (desde o século 9, a maioria dos dirigentes muçulmanos era estrangeira, como os turcos seljúcidas) e a incapacidade de criar instituições estáveis – como os Estados em formação na Europa Ocidental.

O fato é que as cruzadas foram um marco nas relações entre ocidentais e orientais. Naquele momento, os “invasores bárbaros” eram os ocidentais cristãos e a grande potência era a muçulmana. Sobrou daquela guerra um ressentimento amargo, que extravasa de tempos em tempos, como tem acontecido com freqüência desde o ataque terrorista de 2001. Não são poucos os muçulmanos que atribuem o atraso econômico de seus países àquela agressão quase um milênio atrás – e que querem vingança por isso.

A vitória contra os francos e a ascensão de Saladino reforçaram no imaginário muçulmano a idéia de que é possível vencer o inimigo com altivez e senso de justiça. Além disso, as lutas contra os francos ensinaram também que os muçulmanos são mais fortes quando estão unidos – tese que até hoje permanece como uma utopia no Oriente. Mas até que ponto as cruzadas devem ser lembradas em tempos de guerra no Iraque?

“Não há por que ficar buscando na história motivos para reacender animosidades entre os dois povos”, diz o historiador Demant. “As cruzadas marcaram a história por apenas dois séculos. Já a convivência pacífica entre cristãos e muçulmanos sobrevive há mais de mil anos”.

Para saber mais

Na livraria:

As Cruzadas Vistas pelos Árabes - Amin Malalouf, Brasiliense, 1998

Islamic World, Ilustrated History - Francis Robinson, Cambridge University Press, Reino Unido, 2002

Uma História dos Povos Árabes - Albert Hourani, Companhia das Letras, 1991

Islã (Coleção Para Saber Mais) - Rodrigo Cavalcante, Superinteressante, 2003

As cruzadas das crianças


As cruzadas das crianças
Liderados por meninos pobres, milhares de camponeses, mendigos e doentes cruzaram a Europa, em 1212, em procissões que queriam chegar a Jerusalém
por Isabelle Somma e Kako
Estêvão tinha apenas 12 anos. Era analfabeto e ajudava a família cuidando de cabras em Cloyes, no norte da França. Em maio de 1212, foi até Saint Denis, onde o rei Felipe Augusto havia se instalado, para entregar-lhe uma carta. O menino dizia que Jesus em pessoa lhe pedira para liderar uma nova cruzada contra os muçulmanos. Mas, diferentemente das quatro incursões anteriores à Terra Santa, o exército cristão deveria ser formado por crianças. Segundo Estêvão, com o coração e a alma livres de pecados, elas receberiam a ajuda de Deus, venceriam os infiéis e retomariam Jerusalém.

Não se sabe se Felipe recebeu o menino e é provável que ele sequer tenha lido a tal carta. Sabe-se porém que o monarca ficou intrigado com a pregação do pequeno pastor e, como não tinha certeza do que fazer com ele, mandou consultar os acadêmicos da Universidade de Paris. A resposta foi sábia: o rei deveria mandá-lo de volta para casa. E assim o fez. Até aqui, a história está documentada e consta dos textos dos principais cronistas da época, entre eles Vincent de Beauvais e Roger Bacon.

A partir daí, o que aconteceu a Estêvão virou um mito que foi recebendo enxertos aqui e ali, até se tornar um dos episódios mais emblemáticos da Idade Média, conhecido como a Cruzada das Crianças. Estêvão se tornaria uma lenda, mas não seria o único. Na Alemanha, no mesmo ano, movimentos muito semelhantes aconteceram. “Juntas, essas procissões teriam reunido cerca de 40 mil pessoas, segundo os textos medievais, mas a maioria dos especialistas acredita que é exagerado”, diz o historiador Malcolm Barber, da Universidade de Reading, Inglaterra.

Para entender essas manifestações populares é preciso voltar ao início do século 13. Na baixa Idade Média, as migrações eram comuns em toda a

Europa. A população crescera bastante e havia muitos camponeses sem terras, migrando de vila em vila, procurando trabalho ou algum tipo de assistência. Essa multidão que vivia em trânsito ou à beira das estradas era um público farto para os pregadores messiânicos, que dominavam a cena religiosa. “O cristianismo estava ameaçado por muçulmanos e bárbaros e os movimentos de 1212 são filhos dessa crise”, diz Christopher Tyerman, professor do Hertford College, em Oxford, Inglaterra.

Após o fracasso da Quarta Cruzada, entre 1202 e 1204, surgiu no norte da França e no vale do rio Reno (na atual Alemanha) a idéia de que uma dessas peregrinações deveria se transformar numa nova cruzada popular composta apenas por pessoas comuns e desarmada que iria retomar Jerusalém apenas com o auxílio divino. Assim, quando Estêvão apareceu em Saint Denis, parecia uma resposta às preces daquelas almas cristãs atormentadas que perguntavam: “Por que nós não conseguimos expulsar os muçulmanos de solo sagrado?” Na lógica medieval, Deus não parecia disposto a ajudar as tropas comandadas por nobres pecadores, usurpadores e impuros. Por isso, a idéia de realizar uma cruzada com crianças, imaculadas e livres de pecados, como o próprio Jesus, fazia sentido. Se do ponto de vista religioso essa pregação não representava novidade, do ponto de vista prático era um tremendo desafio.

De Saint Denis a Jerusalém seria uma viagem de 4 mil quilômetros que duraria meses ou até anos. Quem seguiria uma criança numa aventura como essas? Que pais deixariam seus filhos partirem assim?

A marcha dos incluídos
Para Tyerman, algumas características da época podem nos ajudar a responder. Primeiro, o próprio conceito de criança era muito diferente do que é hoje. Depois, a palavra latina pueri pode ter sido mal traduzida. “O termo significa ‘homens jovens’ tanto quanto ‘crianças’”, afirma. O professor Barber concorda. “A maioria dos peregrinos não eram crianças, mas jovens trabalhadores rurais, pastores e padres”, diz.

Segundo Barber, já havia um movimento popular em Saint Denis antes da entrada do menino na cidade. “Estêvão de Cloyes chegou à cidade e se juntou a religiosos e peregrinos que voltavam do Oriente pregando a realização de uma nova cruzada. Na cidade, o menino, que tinha fama de milagreiro, foi considerado líder, antes que o grupo fosse dispersado pelo rei”, diz.

No entanto, Christopher Tyerman acha que esse pode ser o ponto final da história. “Se nos basearmos apenas em provas documentais é impossível afirmar que o grupo tenha ido além de Saint Denis”, diz. Para ele, Estêvão e seus amigos nunca chegaram ao Mediterrâneo. “As crônicas francesas da época citam as andanças pelo interior, mas nenhuma afirma que eles estiveram nas proximidades do litoral.”

Porém, num clássico artigo publicado em 1917, na American Historical Review, o historiador Dana Munro, de Princeton, Estados Unidos, afirmou que a turma de Saint Denis seguiu em procissão até Marselha. Munro se baseou em textos escritos entre 30 e 150 anos depois dos fatos e, segundo eles, o cortejo prosseguiu e, por onde passava, recebeu adesões de homens e mulheres de vida irregular – em outras palavras, prostitutas, vagabundos e vigaristas. Clérigos, que desejavam conhecer Jerusalém, e velhos, que queriam morrer por lá, também se uniram à trupe.

O historiador britânico Steven Runciman reproduz em seu livro A História das Cruzadas: O Reino de Acre alguns desses textos antigos. Eles contam que Estêvão teria sido elevado ao posto de santo e quando chegou a Vendôme, no final de julho, uma multidão já o esperava. “Eram por certo vários milhares de jovens, oriundos de todas as partes do país, muitos deles trazidos pelos próprios pais”, escreve Runciman. Dali, partiram para o litoral, onde Estêvão havia prometido fazer com que o mar se abrisse. O menino ordenou ao Mediterrâneo que lhes desse passagem, mas as ondas, é claro, continuaram a bater na praia.

Decepcionados, alguns voltaram para casa, mas a maioria ainda esperava um milagre. E não é que aconteceu algo inusitado? Dois mercadores da cidade, Hugo “o Ferro” e Guilherme “o Porco”, se ofereceram para levar os pequenos cruzados de navio para a Terra Santa. Sem cobrar um tostão, tudo pela glória de Deus. “Em julho de 1212, cerca de 2 mil jovens embarcaram em sete navios”, escreveu Munro. Durante 18 anos, não se ouviria mais falar deles.

As cruzadas germânicas

Não muito longe dali, em Colônia (na região onde atualmente fica a Alemanha), ocorria um movimento popular muito semelhante. Para Steve Runciman, trata-se do mesmo fenômeno. “As histórias de Estêvão devem ter chegado à Renânia (no vale do rio Reno) e apenas algumas semanas depois de ele ter estado em Saint Denis, um jovem camponês de nome Nicolau pregava diante do santuário dos Três Reis Magos”, afirma Runciman. Ele também dizia que o mar se abriria para que as crianças chegassem a Jerusalém e que elas converteriam os muçulmanos. As semelhanças não param por aí: “Nicolau era um menino camponês de 10 anos, humilde e religioso. Ele chegou a reunir cerca de 7 mil pessoas, mas a média de idade era certamente maior que a dos cruzados franceses”, diz Tyerman.

A história dos cruzados germânicos foi mais bem documentada. O bispo de Cremona, Sicardus, relata em um texto da época que o objetivo do grupo de Colônia era ir para o porto de Gênova (na atual Itália) e de lá embarcar para Alexandria, no Egito, de onde seguiria para Jerusalém. Ele também afirma que a população dos vilarejos distribuía-lhes comida e apoiava a marcha, que chegou a ter 20 mil integrantes. Por onde passavam, missas eram celebradas e mais gente seguia com eles. Mas nem as preces nem as aleluias foram suficientes para proteger aqueles meninos durante a travessia dos Alpes. Segundo os Annales Stadenses, textos apócrifos do século 13, apenas um terço do grupo conseguiu vencer as montanhas. Alguns desistiram e voltaram para casa, outros morreram de fome ou de frio.

Os sobreviventes continuaram a jornada até o litoral e em 25 de agosto de 1212 a procissão finalmente chegou a Gênova. Apavorado com aquele bando de maltrapilhos vagando pela cidade, o governador local deu a eles duas alternativas: quem quisesse se instalar na cidade seria bem-vindo, quem tivesse outra intenção deveria deixar a cidade. Cansadas e famintas, algumas crianças conseguiram abrigo nas casas de generosos genoveses. Cada vez menor, a procissão continuou até Pisa, onde novamente se dividiu. Segundo Runciman, alguns embarcaram em dois navios que partiram para a Palestina e também sumiram dos registros históricos. Mas a maioria seguiu com Nicolau para Roma, onde foram recebidos pelo papa Inocêncio III, que ficou comovido pela sua fé, mas constrangido com sua insensatez, e pediu que todos voltassem para casa.

Os registros medievais, a maioria escrita por padres e religiosos, não se importaram em relatar a volta desses peregrinos para casa. Segundo os Annales Stadenses, no entanto, o grupo se dispersou pelas aldeias italianas e jamais se ouviu falar de Nicolau.

Trágicos destinos

Em 1230, chegou à França um padre vindo do Palestina, com uma incrível história para contar. Ele dizia ser um dos jovens sacerdotes que seguiu Estêvão a Marselha e embarcou com ele nos navios rumo ao norte da África. Seu relato foi contado por outro religioso, Albericus Trium Fontium, o único texto da época que cita o acontecido. Segundo ele, três dias depois da partida, na altura da costa da Sardenha, uma forte tempestade atingiu as embarcações. Duas delas foram arremessadas pelos ventos e ondas fortes contra uma pequena ilha rochosa e naufragaram. Todos os passageiros e a tripulação morreram afogados. Os cinco navios restantes seguiram até Alexandria, no Egito. No desembarque, os cerca de 700 sobreviventes foram presos. A generosa oferta dos mercadores era uma armadilha e os jovens integrantes da cruzada foram vendidos como escravos no mercado da cidade.

O jovem padre e alguns outros que sabiam ler e escrever teriam sido comprados pelo próprio governador do Egito, Malek Kamel, que se interessava pela cultura ocidental e empregava-os como intérpretes. Outros foram levados a Bagdá e, desses, nunca mais se ouvira falar.

O relato de Albericus, no entanto, está longe de ser uma unanimidade. “Ele está cheio de inconsistências, mas é provável que esteja baseado em relatos verdadeiros e que seja fiel à história”, afirma o historiador Barber. Já para o professor Tyerman, porém, o texto do religioso não passa de literatura. Seja como for, Albericus não explica qual foi o fim de Estêvão, o menino de 12 anos que liderava o grupo. Teria virado escravo? Morrido no naufrágio? Até hoje, não há pistas sobre seu destino.



Rumo à terra prometida
Mais de 4 mil quilômetrosseparavam as criançasde Jerusalém
Nicolau saiu da Germânia e se encontrou com o papa

1. Colônia

A cidade foi o ponto de partida da marcha, que contava no início com cerca de 7 mil componentes

2. Gênova
O mar não se abriu como Nicolau prometera. Decepcionadas, algumas das crianças acabaram ficando na cidade

3. Pisa

Alguns seguidores conseguiram carona em navios com destino à Palestina. O restante continuou adiante

4. Roma
Outros, incluindo Nicolau, prosseguiram a marcha até Roma, onde se encontraram com o papa Inocêncio III

Estêvão, um jovem pastor de ovelhas, liderou milhares

1. Cloyes
Vilarejo de onde o pequeno pastor teria partido, já como uma procissão com integrantes mirins

2. Saint Denis

Primeira e talvez última parada. Lá, o grupo tentou ser recebido pelo rei, que ordenou a volta de todos para casa

3. Marselha
Em outra versão, eles teriam obtido carona em sete embarcações depois que Estêvão não conseguiu abrir o mar

4. Alexandria
As embarcações atracaram no porto egípcio. Lá, as crianças foram acorrentadas e vendidas como escravas

5. Bagdá
Cerca de 700 crianças teriam sido compradas pelo sultão Malek Kamel e levadas para trabalhar no palácio real


Quarta cruzada, grande furada
A Quarta Cruzada, iniciada em 1202, foi um dos maiores micos da história da Igreja Católica. Sob as bênçãos do papa Inocêncio III, os combatentes armados pelos ricos comerciantes de Veneza nem chegaram ao destino escolhido para o desembarque, Damieta, no Egito. Para pagar pelo transporte, o exército cruzado concordou em invadir o porto húngaro (e cristão) de Zara e entregá-lo aos venezianos. No ano seguinte, a tropa seguiu para Constantinopla, a fim de resolver uma disputa pelo controle do Império Bizantino. Um dos querelantes, Aleixo, era cunhado do imperador germânico, Felipe de Swabia.

O embate opôs cruzados contra bizantinos, ou seja, novamente cristãos contra cristãos. O resultado foi o saque e a completa destruição de Constantinopla. Satisfeitos com o butim, os cruzados esqueceram-se da luta conta os infiéis e voltaram para casa. Os cristãos ortodoxos não perdoariam o papa ou Roma pelo acontecido. Somente em 2001, em viagem à Grécia, o papa João Paulo II conseguiu pôr fim à pendenga, pedindo desculpas oficiais por aquela cruzada.


Os sem-infância
Assim como na Roma antiga, na Idade Média a infância era um período muito breve. Meninos e meninas eram considerados crianças somente até os 6 anos de idade. Dali em diante, eles já enfrentavam uma longa jornada de trabalho. As famílias de agricultores empregavam seus filhos no pesado trabalho da lavoura. De sol a sol elas participavam da plantação e da colheita. Os pais artesãos colocavam sua prole para trabalhar como aprendizes. Ao dominar o ofício, os pequenos já se viravam para ajudar no sustento da casa. As meninas não tinham sorte muito diferente. Desde muito jovens já ajudavam nos serviços domésticos. Naquela época, ao nascer, a criança também tinha um status diferente do atual. As crianças não tinham direitos. Elas eram propriedade dos pais e era dessa forma que eram tratadas. Essa situação está refletida nas expressões artísticas da época. Até o século 12, a arte medieval desconhecia ou ignorava as crianças.

Em esculturas e pinturas, elas eram retratadas como adultos em miniatura: o corpo era igual, somente a altura era menor. No dia-a-dia, as crianças trajavam roupas iguais às dos adultos e que em nada lembravam sua idade. Os casamentos eram realizados muito cedo. Meninas a partir dos 12 anos já eram sérias candidatas ao noivado. Portanto, os adolescentes da época eram jovens adultos que já trabalhavam, casavam e tinham filhos. Essa situação só começou a mudar na Renascença. Durante esse período, os artistas começaram a retratar as crianças de maneira mais realista, brincando ou sendo amamentadas. Mais tarde, durante o iluminismo, o filósofo inglês John Locke (1632-1704) defendeu que a mente infantil era uma “tábula rasa”, que era alimentada com conhecimentos passados pelo mundo exterior.

E, portanto, a qualidade das primeiras experiências seria vital para sua boa formação. Somente no século 18, o conceito medieval de que as crianças eram seres maus por natureza caiu por terra. Segundo o filósofo francês Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), elas nasciam boas e deveriam ser preservadas das maldades do mundo exterior para que mantivessem esse espírito. A obra de Rousseau influenciaria escritores como Victor Hugo (1802-1885) e Charles Dickens (1812-1870), que expuseram a bárbara exploração da mão-de-obra infantil.


Saiba mais
Livros

A História das Cruzadas: O Reino de Acre e as Últimas Cruzadas, Steven Runciman, 2003

The Children´s Crusade, American Historical Review, volume 19, de Dana C. Munro, O livro de Runciman dedica apenas metade de um capítulo ao assunto, em que apresenta a versão de Albericus. O melhor texto sobre o que realmente teria ocorrido é o de autoria de Dana C. Munro

Revista Aventuras na Historia

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